Rio Branco, 30 de julho de 2025.

Por que tanto incômodo com a fé alheia?

Por que tanto incômodo com a fé alheia?

Legendário
Legendário

Por Daigleíne Cavalcante

Na última semana, um vídeo publicado no Instagram de um pastor acreano sobre o primeiro Top Legendários a ser realizado no Acre gerou uma onda de críticas nas redes sociais. O conteúdo rapidamente foi transformado em matéria jornalística e, como consequência, uma enxurrada de comentários, muitos negativos.

As reações variam. Alguns chamam o evento de “modinha”, outros dizem que o pastor “deveria estar pastoreando, não incentivando aventuras” e há quem critique abertamente o custo de participação, sugerindo que se trata apenas de uma forma disfarçada de lucrar.

O evento, que já havia sido alvo de polêmica meses atrás após a presença de figuras públicas conhecidas, volta ao centro do tribunal digital, onde todos julgam, poucos escutam e quase ninguém se dispõe a entender.

Mas a pergunta que não quer calar é: por que tamanha resistência a um grupo de homens que escolhe se reunir para cultivar a espiritualidade?

Vivemos em uma sociedade em que homens se encontram para jogar, festejar, atirar, pescar ou participar de cruzeiros regados a bebida e ostentação e tudo isso é considerado normal.

Pouco se questiona sobre o custo, o propósito ou o impacto dessas experiências, mas quando a escolha é se conectar com a natureza, refletir sobre a própria vida, amadurecer espiritualmente e buscar a Deus, os apontamentos surgem com velocidade e fúria.

Será que é porque estamos diante de uma geração de homens que cresceram ouvindo que não podiam chorar, não podiam vacilar, não podiam sentir? Será que é porque como sociedade estamos acostumados com aquela masculinidade que normaliza a promiscuidade, prostituição, pornografia, traição?

Será que quando vemos homens romperem com esse padrão para encarar suas fragilidades e buscar sentido em algo maior o incomodo surge?

Se sim, talvez o incômodo não seja com o evento em si, mas com o espelho que ele oferece e a possibilidade de quem escolhe ir mostrar  que existem outros jeitos de ser homem.

Quando um grupo decide trocar o “homem não chora” pelo “homem se escuta”, quebra-se uma vitrine muito confortável: aquela em que a vulnerabilidade masculina é sempre piada, exagero ou fraqueza.

De repente, fica visível que fugir do diálogo interno custa mais caro do que enfrentar o próprio vazio; que amadurecer exige bem mais coragem do que bancar a caricatura do durão. E isso assusta.

No fundo, o barulho não é contra reunir-se para rezar, meditar ou caminhar. É contra sair do padrão. É contra homens que escolhem olhar para dentro, admitir feridas, pedir ajuda e, ainda por cima, cobrar de si a mesma integridade que historicamente se exigiu das mulheres.

Então, antes de criticar o preço, a logística ou a hashtag, vale perguntar: o que exatamente incomoda? A energia “disfarçada” de lucro ou a coragem explícita de mostrar fragilidade? O ingresso caro ou o risco de que esse tipo de encontro vire contágio e mais homens decidam se reinventar?

Se o Top Legendários, ou qualquer outro retiro, serve de gatilho, talvez a provocação que ele traz seja necessária. Talvez estejamos apenas começando a entender que espiritualidade, afeto e propósito também são territórios masculinos. E que o verdadeiro escândalo, para uma sociedade que ainda lucra com a o jeito de viver de muitos homens, é vê los escolhendo a própria cura.

“Ah, mas pastor tem que ensinar a bíblia, pastorear os fiéis e não subir a montanha, entrar na mata ou entrar em modinha”

Vale lembrar que o próprio Cristo, figura central da fé cristã, fez exatamente isso. Retirou o povo das estruturas religiosas e os levou para o alto dos montes, para as margens do mar, para o coração da natureza. Chamou homens, os ensinou, os empoderou e os enviou para fazer o mesmo. Não em templos, mas no mundo.

“Ah, mas tem que pagar.”

Ora, se homens pagam para pescar, para caçar, para viajar, para jogar, e tudo isso é considerado lazer legítimo, por que o pagamento por uma experiência espiritual se torna pecado? A quem diz respeito essa escolha, senão aos próprios envolvidos?

É preciso reconhecer: muitos buscam transformação, propósito e direção em livros de autoajuda, cursos motivacionais e programas de coaching. O que poucos entenderam é que tudo isso já estava disponível, desde sempre, por meio da fé.

O problema, talvez, é que quando homens decidem caminhar para dentro de si, e para mais perto de Deus, eles se tornam mais conscientes, mais íntegros, mais livres.
E talvez esse seja o “xis” da questão: “Gente livre demais assusta!”

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Daigleíne Cavalcante

Daigleíne Cavalcante é jornalista com 17 anos de experiência, palestrante, mentora e estrategista em comunicação e oratória.

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