Rio Branco, 18 de outubro de 2025.

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Fiapos nos dentes: Eis que a temporada de manga chegou

Por Lane Valle

Todo ano, entre o final da seca e o começo das primeiras chuvas, acontece um fenômeno natural que transforma completamente a paisagem da cidade: não, não é o ipê florido, nem o preço do tomate caindo. São elas, suculentas, escorregadias e que exalam um cheiro doce no ar: a temporada de mangas –, aquela fruta que ninguém resiste, cada uma com sua personalidade, textura e nível de ameaça de sujeira.

E tem quem diga que essa é a verdadeira estação do ano por aqui: nem estiagem, nem chuva. É a estação da manga. São árvores carregadas que parecem prestes a cair. É manga pelas ruas, calçadas, quintais, janelas da cidade e, claro, nos capôs dos carros. É o caos mais doce do ano.

Já perceberam que a manga não se contenta em ser apenas saboreada. Ela quer ser sentida, cheirada, escorrida pelo braço. É como uma experiência sensorial completa. Não existe elegância comendo manga. A única maneira de fazer isso “com classe” é de garfo e faca – e, convenhamos, isso é como ouvir samba sentado.

Manga é aquela fruta que ninguém come sem se lambuzar. Pode até tentar, já que sempre vai ter aquele ser humano “exótico” que surge com o tal garfo e faca pra comer manga. Uma afronta. Um atentado tropical. Uma tentativa frustrada de transformar um fruto anárquico e ensolarado em sobremesa de restaurante francês.

A manga, coitada, até tenta colaborar, mas logo escorrega da faca, pula do prato, se vinga sujando a camisa branca e mostrando quem realmente manda. Afinal, os verdadeiros amantes desta fruta devem concordar, que manga se come com as mãos, com a cara, com a alma. E se não tiver pelo menos três fiapos presos entre os dentes no final, você fez errado. Eu mesma estou aqui com os dentes cheios de fiapos escrevendo esse artigo depois de me deliciar com pelo menos quatro delas.

Mas vamos combinar, a manga é uma fruta democrática, isso ninguém pode negar. Ela atende a todos os públicos — menos os que tentam comer de camiseta branca. Com esses, ela tem uma rixa pessoal.

Além de comer pura (leia-se: devorar sem controle), a manga vai pra salada, vira molho, sobremesas, aparece até em receitas gourmet com nomes chiques.

A parte triste é quando a temporada vai embora. Em poucas semanas, as mangas somem tão rápido quanto chegaram. A cidade volta ao normal, sem explosões frutíferas nos telhados, sem perfume no ar, sem medo de escorregar numa casca traiçoeira.

A manga desaparece sorrateiramente das árvores, volta a custar o olho da cara nas feiras, e você percebe que só sobrou aquela versão meio verde no mercado, com gosto de “quase lá”.

Então, neste tempo abençoado pela natureza, faça sua parte. Honre a manga. Ataque com paixão. Lambuze-se sem culpa. Porque fiapo no dente passa, mas manga boa assim, só no ano que vem.

Lane Valle é fonoaudióloga, jornalista e colaboradora do Portal Acre.

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SASDH