
A acreana de Xapuri Rosineide Evangelista da Costa completou, em setembro passado, 40 anos de dedicação à comunicação pública. Produtora da tradicional Voz do Brasil, programa de rádio mais antigo do país e do hemisfério sul ainda em difusão, a jornalista é reconhecida pela habilidade em encontrar personagens que dão humanidade às reportagens e pela paixão com que vive o jornalismo.
Em Brasília, ela é chamada de Rose, mas em Xapuri continua sendo a Rosinha, “a filha do Chico Evangelista”, como ela costuma dizer com orgulho. O pai, figura marcante na cidade, foi um verdadeiro homem de múltiplas vocações. “Eu costumo dizer que lá em Xapuri, meu pai só não foi padre nem médico”, brinca Rosineide.
De fato, Francisco Evangelista de Abreu era um polivalente. Foi radialista, comentarista esportivo, trabalhou no Instituto de Identificação Raimundo Hermínio de Melo — da Secretaria de Segurança Pública —, vereador, presidente da Câmara Municipal, dirigente esportivo apaixonado pelo Vasco da Gama a ponto de ter criado um time da cruz de malta local, e até delegado de polícia substituto, nos momentos em que o titular se ausentava da cidade.
Sua presença ativa e curiosa inspirou a filha, que, ainda criança, ouvia a Voz do Brasil ao lado dele, sem imaginar que um dia faria parte daquele universo sonoro. “Cresci ouvindo rádio com ele. O sinal da Nacional chegava fraco, mas a gente insistia pra ouvir a Voz do Brasil. Nunca imaginei que um dia estaria dentro daquele mesmo programa”, lembra Rosineide.

Da sala de aula para o telex
Rosineide concluiu o ensino médio e o curso de magistério na escola Padre Felipe Galerani, que funcionava no prédio da escola Divina Providência, em Xapuri. O sonho era ser professora ou bancária, mas o destino a levou a outro caminho. Em 1985, mudou-se para Rio Branco e foi contratada como operadora de telex pela extinta Empresa Brasileira de Notícias (EBN), por indicação de uma amiga. “Eu ligava quase todo dia pra saber se tinha alguma novidade. Acho que entre tantos currículos, o chefe acabou percebendo minha vontade de trabalhar. E foi assim que tudo começou”, conta.
Na época, o Acre ainda não tinha curso de Jornalismo. O aprendizado vinha na prática, com o apoio dos colegas mais experientes. “Os jornalistas mais antigos nos ensinavam o que sabiam. Lembro do Zé Leite, que era editor do Jornal Rio Branco, e do Campos Pereira, que pegava material com a gente na EBN. Foi ali que aprendi o que é fazer jornalismo de verdade”, recorda.
Em pouco tempo, Rosineide já ajudava nas produções, acompanhava repórteres e cobria eventos importantes — entre eles, eleições e o julgamento de Chico Mendes, conterrâneo e símbolo da luta ambiental. “Foram anos de muito aprendizado. Era tudo mais difícil, mas a gente dava um jeito. Hoje é tudo mais fácil, mas naquela época o jornalismo era feito na raça”, reflete.
Transferida para Brasília no fim dos anos 1990, ela consolidou a carreira na produção da Voz do Brasil, tornando-se referência pela habilidade de encontrar personagens em locais improváveis. A rotina intensa nunca a fez desistir. “Sempre acreditei que vale a pena insistir. Se você quer uma coisa, tem que correr atrás, não pode desistir no primeiro obstáculo. Foi assim que construí uma carreira com base sólida”, afirma.

Trabalho como terapia e legado familiar
A jornada também foi marcada por superação. Aos 39 anos, enfrentou um câncer e ouviu da médica que talvez fosse hora de parar. Mas ela decidiu continuar. “O trabalho sempre foi minha terapia. Estar entre colegas, conversando com as pessoas, produzindo matérias — isso me fazia bem, me mantinha viva.”
Hoje, prestes a completar 60 anos, Rosineide vive um momento de reconhecimento. Em 2025, o mesmo número cinco que marca etapas da sua vida — nascida em 1965, contratada em 1985 — se repete em um ano de celebrações. “Foi um ano de reconhecimento. A Voz do Brasil completou 90 anos, eu completei 25 anos na produção do programa e recebi homenagens tanto na empresa quanto no Congresso Nacional. Tudo parece se encaixar”, diz, com gratidão.
Orgulhosa de suas raízes, a filha de dona Francisca Rodrigues da Costa, outra figura marcante de sua vida, costuma lembrar de onde veio para entender aonde chegou. “Uma vez, um psicólogo da empresa perguntou de onde eu vim e pra onde eu ia. Eu respondi: vim de Xapuri, e hoje estou em Brasília, no centro da política, no coração onde tudo acontece. Trabalho numa empresa pública que faz comunicação governamental. Isso pra mim é um orgulho enorme.”
Mais do que uma história profissional, a trajetória de Rosineide Evangelista é também uma mensagem de perseverança. “Quero que minha história sirva de inspiração para o pessoal aí do Acre, para quem está começando, para quem se sente desanimado. Eu saí de Xapuri, e cheguei até aqui. É possível, sim, quando a gente acredita”, enfatiza.

O amor pelo rádio e pela comunicação, herdado de Chico Evangelista, parece correr nas veias. Assim como o pai, Rosinha enxerga na comunicação um instrumento de aproximação e transformação. De Xapuri a Brasília, do telex ao WhatsApp, ela transformou o ofício de produtora em arte de ouvir e conectar pessoas em um percurso que honra as raízes familiares e reafirma o papel da comunicação pública como espelho da diversidade e da força do povo brasileiro.








