
A Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), em parceria com o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), está realizando um mapeamento inédito da bioindústria na Amazônia Legal. Até o momento, o levantamento já identificou cerca de 11 mil empreendimentos associados à sociobiodiversidade na região. Desses, quase 6 mil são considerados bioindústrias.
A categorização como bioindústria considera critérios de sustentabilidade ambiental, inclusão produtiva, agregação de valor local e uso de ativos da biodiversidade amazônica. Os empreendimentos também são avaliados quanto ao estágio de formalização, acesso a mercados, grau de inovação e práticas de beneficiamento ou transformação industrial.
A iniciativa está alinhada à Missão 5 da Nova Indústria Brasil (NIB) e tem como objetivo orientar políticas públicas e estratégias de investimento voltadas ao fortalecimento da bioeconomia amazônica. O estudo permanece em andamento e, até a conclusão prevista para dezembro de 2025, a expectativa é de que o número de bioindústrias mapeadas seja duplicado.
O levantamento priorizou cadeias produtivas com alto valor socioambiental, como açaí, castanha, cacau, guaraná, babaçu, buriti e mandioca. Um dos destaques é o Arranjo Produtivo Local (APL) de óleos vegetais e fitocosméticos no Vale do Juruá (AC), que reúne cooperativas como a Coopercintra e a Coopfrutos, apoiadas pelo Programa REM Acre – Fase II.
Além dos empreendimentos, o estudo também identificou 589 registros de acesso ao patrimônio genético e 2.790 notificações de uso de conhecimento tradicional associado, conforme dados do Sistema Nacional de Gestão do Patrimônio Genético e do Conhecimento Tradicional Associado (SisGen). Esses números refletem o cumprimento da Lei nº 13.123/2015, que regula o acesso ao patrimônio genético brasileiro e estabelece regras para a repartição de benefícios, reconhecendo e protegendo os direitos das populações tradicionais sobre seus saberes ancestrais.
De acordo com a diretora de Economia Sustentável e Industrialização da ABDI, Perpétua Almeida, o mapeamento contribui para o avanço de políticas industriais sustentáveis:
“Esse trabalho é fundamental para orientar investimentos e políticas públicas. A bioindústria pode ser a chave para aliar preservação ambiental e geração de renda para as populações locais”, afirma.
Foram mapeados ainda 42 Arranjos Produtivos Locais (APLs) e Indicações Geográficas (IGs) com potencial estratégico, com destaque para o APL do Açaí (PA), a IG da Castanha do Brasil (AC) e o APL do Guaraná de Maués (AM).
A metodologia do levantamento combina análises de dados secundários com coleta primária em campo — por meio de entrevistas, visitas técnicas e formulários — com apoio de uma rede de bolsistas e especialistas em bioeconomia atuando em toda a Amazônia Legal. Essa abordagem híbrida permite uma leitura mais aprofundada e territorializada das cadeias produtivas vinculadas à sociobiodiversidade.
Desafios e perspectivas
A pesquisa também identificou obstáculos que limitam o avanço da bioindústria na região, como lacunas normativas, insegurança jurídica, entraves fiscais e desafios logísticos.
Para a gerente de Cooperação e Inteligência Competitiva da ABDI, Cynthia Araújo, os dados levantados reforçam a importância de políticas públicas integradas para fortalecer a bioeconomia na região:
“A Amazônia ocupa papel central nas políticas de biodiversidade do país. Para transformar esse potencial em desenvolvimento concreto, é necessário avançar em ações que promovam a valorização econômica local, com sustentabilidade, segurança jurídica e o fortalecimento das capacidades existentes”.
Na mesma linha, a pesquisadora de Políticas Públicas do IPAM, Rafaela Reis, destaca que o ecossistema produtivo da bioindústria já está em curso e, com apoio necessário, pode crescer e se consolidar:
“A bioeconomia na Amazônia já existe. O que falta é criar o ambiente adequado para que ela se fortaleça e escale. Estamos falando de políticas que garantam acesso, visibilidade, estrutura e oportunidades para os empreendimentos que nascem e resistem nos territórios.”
Ela reforça que o estudo considera elementos estruturais fundamentais para o desenvolvimento sustentável da região:
“Quando falamos em estruturar uma bioindústria na Amazônia, falamos de construir um modelo que valorize o conhecimento tradicional, a inovação local e que esteja alinhado às políticas públicas nacionais e aos arranjos territoriais”.
Cynthia Araújo acrescenta que a plataforma digital resultante do estudo será estratégica para consolidar essas ações:
“A plataforma vai organizar os dados e conectar atores, atraindo investimentos e garantindo que as comunidades locais sejam as primeiras beneficiadas. O objetivo é manter as informações atualizadas, evitando que o mapeamento seja apenas uma fotografia pontual”, conclui.
O lançamento oficial da plataforma com dados atualizados sobre a bioindústria na Amazônia está previsto para novembro de 2025, durante a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), em Belém (PA)